domingo, 30 de janeiro de 2011

Mobilizações no Egito e Tunísio. Versões e fatos

Compreender o momento que vivem os países do norte da África com movimentos rebelando-se e protestando contra as ditaduras e contra a situação de miséria da população encontram explicações que partem nos mais diversos ângulos. Muito além da perspectiva que as lideranças do Ocidente tentam passar como versão oficial, o que acontece não é simplesmente o fim de ditaduras como mais um movimento de democratização do mundo. Aqui seguem três artigos que em pontos divergem, mas que em comum mantém a ideia de que foi o Ocidente quem financiou os problemas econômicos desses países e sustentou suas ditaduras. Agora, bons moços, líderes do ocidente manifestam a necessidade de democratização. O artigo de Nasser destaca que “desemprego em massa, preços dos alimentos e repressão política é uma combinação explosiva mais perigosa do que os homens bomba” subestimada pela Europa e EUA. O artigo de Chossudovsky, não só denuncia o patrocínio pelos EUA e pela Europa dos governos ditadores do Egito e Tunísia nas últimas décadas, tratando os ditadores como fantoches subservientes às regras do FMI. O autor ainda apresenta fatos que revelam a participação do governo americano nos movimentos da oposição no Egito, infiltrado nas mobilizações e financiando os ativistas pelos canais digitais da internet. Por fim, o artigo de Azenha, entende a crise do Egito como o “desabar do grande pilar da política externa dos Estados Unidos no Oriente Médio”, e espera do governo Dilma, a mesma ousadia e visão de futuro que Celso Amorim demonstrou no Governo Lula, especialmente ao líder com a nova realidade dos países mulçumanos.

Blog do Miro
Altamiro Borges

As causas da explosão popular no Egito

Reproduzo artigo de Reginaldo Nasser, publicado no sítio Carta Maior:

As mobilizações populares na Tunísia, Egito, Iêmen e em outros lugares são um alerta para o chamado mundo desenvolvido e seria uma grande avanço para a democracia se esta região que permanece imersa na violência, em fraudes eleitorais e miséria crescente da população recebesse o devido apoio internacional nesse momento.

O porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs, disse que os EUA poderão revisar a ajuda ao Egito. O presidente Obama solicitou às autoridades egípcias que evitem o uso de qualquer tipo de violência contra manifestantes pacíficos, alertando que " aqueles que protestam nas ruas têm uma responsabilidade de expressar-se pacificamente. Já a chanceler alemã, Angela Merkel, afirmou que a “estabilidade do país é muito importante, mas não a qualquer preço”. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pediu que "os líderes do Egito escutem as preocupações legítimas e os desejos de seus cidadãos”. O primeiro ministro britânico David Cameron declarou: “Eu acho que precisamos de reformas. Quero dizer que nós apoiamos o progresso e o reforço da democracia”.
Como avaliar a atitude desses líderes mundiais? Patética, cínica, hipócrita, irresponsável? Talvez devêssemos recorrer a um grande pensador liberal do século XIX, Aléxis de Tocqueville, e ouví-lo a respeito dos períodos revolucionários na França. Tocqueville alertava para o fato de líderes, que adquiriram experiência em lidar com a política em ambiente de ausência de liberdade, quando se encontraram diante de uma revolução que chegou “inesperadamente”, se assemelhavam aos remadores de rio que, de repente, se vêem instados a navegar no meio do oceano. Os conhecimentos adquiridos em suas viagens por águas calmas vão proporcionar mais problemas do que ajuda nessa aventura, e na maioria das vezes exibem mais confusão e incerteza do que os próprios passageiros que supostamente deveriam conduzir.
Já havia sinais reveladores dessas turbulências, mas o Ocidente preferia se preocupar com burcas, minaretes e terrorismo. Um relatório do Banco Mundial, publicado em 2009, informava que os países árabes importavam cerca de 60% dos alimentos que consomem e já são os maiores importadores de cereais no mundo, dependendo de outros países para a sua segurança alimentar. A elevação dos preços nos mercados mundiais, desde 2008, já causou ondas de protestos em dezenas de países e milhões de desempregados e pobres nos países árabes, como foram os casos da Argélia , em 1988, e da Jordânia em 1989. Um exemplo mais recente, além da região árabe, é o Quirguistão onde um aumento da eletricidade e tarifas de celulares causaram manifestações com dezenas de mortos e milhares de feridos.
Aqueles que temem o crescimento do “islamismo radical” como fator de instabilidade nessa região, deveriam estar mais atentos em relação às “ditaduras amistosas” que, na verdade, são as principais responsáveis pela insegurança no mundo. Desemprego em massa, preços dos alimentos e repressão política é uma combinação explosiva mais perigosa do que os homens bomba.
A demografia no mundo árabe é também um grande problema. A população cresceu cinco vezes durante o século XX, e o crescimento continua a uma média anual de 2,3%. A população do Egito está em torno de 80 milhões. Em 2050 (de acordo com projeções da ONU) deverá ter 121 milhões. A população da Argélia irá crescer de 33 milhões em 2007 para 49 milhões em 2050; a do Iêmen de 22 a 58 milhões. Isso significa que mais empregos precisam ser criados - e mais alimentos importados, ou aumentar a capacidade para produzir mais. No caso do Egito dois terços da população são jovens abaixo de 30 anos, dos quais 90% estão desempregados.
Baseada no turismo, na agricultura e na exportação de petróleo e algodão, a economia é incapaz de sustentar a taxa de crescimento demográfico. 40% da população vive com menos de US$ 2 (R$ 3,30) por dia, o país está na 101ª posição no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano)
De certa forma a auto-imolação do jovem tunisiano, Mohamad Bouazizi, que deflagrou a onda de protestos na Tunisia revela, no nível individual, aquilo que está acontecendo nas sociedades daquela região como um todo. Ele não se rebelou, apenas porque não encontrou trabalho que refletisse suas ambições profissionais, mas sim quando um oficial da polícia confiscou as frutas e legumes que estava vendendo sem autorização. Quando foi fazer uma reclamação para buscar justiça, sua demanda foi rejeitada.
Provavelmente foi este sentimento de injustiça que levou Mohamed Bouazizi e milhares de pessoas às ruas, empenhados em quebrar o ciclo da miséria e opressão.
Talvez seja mais confortável para a chamada comunidade internacional lidar com um mundo árabe dividido entre nacionalistas, relativamente seculares, de um lado e islamismo radical, de outro, do que um mundo mais complexo, com problemas econômicos, sociais e políticos que conta com sua cumplicidade.

Blog do Miro
Altamiro Borges

As manobras do imperialismo no Egito

Reproduzo polêmico artigo de Michel Chossudovsky, publicado no sítio Resistir:

O regime Mubarak pode entrar em colapso face ao vasto movimento de protesto à escala nacional. Quais as perspectivas para o Egito e o mundo árabe?
"Ditadores" não ditam, eles obedecem ordens. Isto é verdade tanto na Tunísia como na Argélia e no Egito.
Ditadores são sempre fantoches políticos. Os ditadores não decidem.
O presidente Hosni Mubarak foi o fiel servidor dos interesses econômicos ocidentais e assim era Ben Ali.
O governo nacional é o objecto do movimento de protesto. O objetivo é remover o fantoche ao invés do mestre do fantoche. Os slogans no Egipto são "Abaixo Mubarak, abaixo o regime". Não há cartazes anti-americanos... A influência avassaladora e destrutiva dos EUA no Egito e por todo o Médio Oriente permanece oculta.
As potências estrangeiras que operam nos bastidores estão protegidas do movimento de protesto.
Nenhuma mudança política significativa se verificará a menos que a questão da interferência estrangeira seja tratada de forma explícita pelo movimento de protesto.
A Embaixada dos EUA no Cairo é uma importante entidade política, sempre ofuscando o governo nacional, não é alvo do movimento de protesto.
No Egito, em 1991 foi imposto um devastador programa do FMI na altura da Guerra do Golfo. Ele foi negociado em troca da anulação da multimilionária dívida militar do Egito para com os EUA bem como da sua participação na guerra. A resultante desregulamentação dos preços dos alimentos, a privatização geral e medidas de austeridade maciças levaram ao empobrecimento da população egípcia e à desestabilização da sua economia. O Egito era louvado como uma "aluno modelo" do FMI.
O papel do governo de Ben Ali na Tunísia foi impor os remédios econômicos mortais do FMI, os quais num período de mais de vinte anos serviram para desestabilizar a economia nacional e empobrecer a população tunisina. Ao longo dos últimos 23 anos, a política econômica e social na Tunísia foi ditada pelo Consenso de Washington.
Tanto Hosni Mubarak como Ben Ali permaneceram no poder porque os seus governos obedeceram e aplicaram efetivamente os diktats do FMI.
Desde Pinochet e Videla até Baby Doc, Ben Ali e Mubarak, os ditadores têm sido instalados por Washington. Historicamente, na América Latina, os ditadores eram nomeados através de uma série de golpes militares patrocinados pelos EUA.
Hoje eles são nomeados através de "eleições livres e justas" sob a supervisão da comunidade internacional.
Nossa mensagem ao movimento de protesto:
As decisões reais são tomadas em Washington DC, no Departamento de Estados dos EUA, no Pentágono, em Langley, sede da CIA, na H Street NW, as sedes do Bando Mundial e do FMI.
O relacionamento do "ditador" com interesses estrangeiros deve ser considerado. Derrubar fantoches políticos mas não esquecer de alvejar os "ditadores reais".
O movimento de protesto deveria centrar-se na poltrona real da autoridade política; deveria ter como alvo a Embaixada dos EUA, a delegação da União Europeia, as missões nacionais do FMI e do Banco Mundial.
Uma mudança política significativa só pode ser assegurada se a agenda de política econômica neoliberal for jogada fora.
Substituição de regime
Se o movimento de protesto deixar de tratar o papel das potências estrangeiras incluindo pressões exercidas por "investidores", credores externos e instituições financeiras internacionais, o objetivo da soberania nacional não será alcançado. Nesse caso, o que ocorrerá é um processo estreito de "substituição de regime", o qual assegura continuidade política.
"Ditadores" são postos e depostos. Quando eles estão politicamente desacreditados e já não servem os interesses dos seus patrocinadores estadounidenses, eles são substituídos por um novo líder, muitas vezes recrutado dentro das fileiras da oposição política.
Na Tunísia, a administração Obama já se posicionou. Ela pretende desempenhar um papel chave no "programa de democratização" (isto é, manutenção das chamadas eleições justas). Ela também pretende utilizar a crise política como um meio de enfraquecer o papel da França e consolidar a sua posição na África do Norte:
"Os Estados Unidos, que foram rápidos em avaliar a vaga de protesto nas ruas da Tunísia, estão a tentar pressionar em seu proveito a fim de promover reformas democráticas no país e outras mais além.
O alto enviado dos EUA para o Médio Oriente, Jeffrey Feltman, foi o primeiro responsável estrangeiro a chegar ao país depois de o presidente Zine El Abidine Ben Ali ser derrubado em 14 de Janeiro e suavemente apelou a reformas. Ele disse na terça-feira que só eleições livres e justas fortaleceram e dariam credibilidade à liderança sob ataque do estado norte africano.
"Espero certamente que estaremos utilizando o exemplo tunisino" em conversas com outros governos árabes, acrescentou o secretário de Estado Feltman.
Ele foi despachado para o país norte africano a fim de oferecer a ajuda dos EUA na turbulenta transição de poder e encontrar-se com ministros e figuras da sociedade civil tunisina.
Feltman viaja para Paris na quarta-feira a fim de discutir a crise com líderes da França, promovendo a impressão de que os EUA está a conduzir apoio internacional a uma nova Tunísia, em detrimento da antiga potência colonial, a França...
Países ocidentais apoiaram por longo tempo a derrubada liderança da Tunísia, encarando-a como um baluarte contra militantes islâmicos na região norte africana.
Em 2006, o então secretário da Defesa dos EUA Donald Rumsfeld, falando em Tunis, louvou a evolução do país.
A secretária de Estado Hillary Clinton, agilmente, interveio com um discurso em Doha a 13 de Janeiro advertindo líderes árabes para permitirem aos seus cidadãos maiores liberdades ou [sofrerem] o risco de extremistas explorarem a situação.
"Não há dúvida de que os Estados Unidos estão a tentar posicionar-se muito rapidamente do lado bom..." AFP: US helping shape outcome of Tunisian , enfase acrescentada.

Será que Washington terá êxito em nomear um novo regime fantoche?
Isto depende muito da capacidade do movimento de protesto de tratar o papel insidioso dos EUA nos assuntos internos do país.
Os poderes avassaladores do império não são mencionados. Numa ironia amarga, o presidente Obama exprimiu o seu apoio ao movimento de protesto.
Muitas pessoas dentro do movimento de protestos são levadas a acreditar que o presidente Obama está comprometido com a democracia e os direitos humanos e é apoiante da resolução da oposição de destronar o ditador, o qual fora antes instalado pelos EUA.
Cooptação de líderes da oposição
A cooptação dos líderes dos principais partidos da oposição de organizações da sociedade civil na previsão do colapso de um governo fantoche autoritário faz parte dos desígnios de Washington, aplicados em diferentes regiões do mundo.
O processo de cooptação é implementado e financiado pelos EUA com base em fundações incluindo o National Endowment for Democracy (NED) e o Freedom House (FH). Tanto o FH como o NED têm ligações ao Congresso dos EUA, ao Council on Foreign Relations (CFR) e ao establishment de negócios estado-unidense. Tanto o NED como o FH são conhecidos por terem laços com a CIA.
O NED está envolvido ativamente na Tunísia, Egipto e Argélia. A Freedom House apoia várias organizações da sociedade civil no Egito.
"O NED foi estabelecido pela administração Reagan depois de o papel da CIA nos financiamentos encobertos para derrubar governos estrangeiros ter sido trazido à luz, levando ao descrédito dos partidos, movimentos, revistas, livros, jornais e indivíduos que receberam financiamento da CIA. ... Como uma fundação bipartidária, com participação dos dois principais partidos, bem como da AFL-CIO e da US Chamber of Commerce, o NED assumiu o comando do financiamento de movimentos para derrubar governos estrangeiros, mas abertamente e sob a rubrica da "promoção da democracia". (Stephen Gowans, January « 2011 "What's left"
Se bem que os EUA tenha apoiado o governo Mubarak durante os últimos trinta anos, fundações dos EUA com laços no Departamento de Estado e no Pentágono apoiaram ativamente a oposição política incluindo o movimento da sociedade civil. Segundo a Freedom House: "A sociedade civil egípcia é tanto vibrante como constrangida. Há centenas de organizações não governamentais dedicadas a expandir direitos civis e políticos no país, operando num ambiente altamente regulado". (Freedom House Press Releases).
Numa ironia amarga, Washington apoia a ditadura Mubarak, incluindo suas atrocidades, enquanto também apoia e financia seus detractores, através das actividades do FH, NED, dentre outras.
O esforço da Freedom House para envolver uma nova geração de advogados proporcionou resultados tangíveis e o programa New Generation no Egipto ganhou proeminência tanto ao nível local como internacional. Membros visitantes egípcios de todos os grupos da sociedade civil receberam [Maio 2008] atenção sem precedentes e reconhecimento, incluindo reuniões em Washington com o secretário de Estado, o Conselheiro de Segurança Nacional e membros eminentes do Congresso. Nas palavras de Condoleezza Rice, eles representam a "esperança para o futuro do Egipto".
http://www.freedomhouse.org/template.cfm?page=66&program=84
Política dúplice: Conversar com "ditadores", misturar-se com "dissidentes"
Sob os auspícios da Freedom House, em maio de 2008 dissidentes egípcios e oponentes de Hosni Mubarak foram recebidos por Condoleezza Rice no Departamento de Estado e no Congresso dos EUA.
Em maio de 2009, Hillary Clinton encontrou-se com uma delegação de dissidentes egípcios, visitando Washington sob os auspícios da Freedom House. Foram reuniões de alto nível. Este grupos de oposição, os quais estão a desempenhar um papel importante no movimento de protesto, estão destinados a servir os interesses dos EUA. A América é apresentada como um modelo de liberdade e justiça. O convite de dissidentes para o Departamento de Estado e o Congresso dos EUA pretende instilar um sentimento de compromisso e lealdade a valores democráticos americanos.
Os mestres dos fantoches apoiam dissidentes contra os seus próprios fantoches?
Chama-se a isto "alavancagem política", "fabricação de dissidentes". O apoio a ditadores bem como a oponentes do ditador como um meio de controlar a oposição política.
Estas acções da parte da Freedom House e do National Edowment for Democracy, por conta das administrações Bush e Obama, asseguram que a oposição da sociedade civil financiada pelos EUA não dirigirá suas energias contra os mestres do fantoche por trás do regime Mubarak, nomeadamente o governo dos EUA.
Estas organizações da sociedade civil financiadas pelos EUA actuam como um "Cavalo de Troia" o qual fica incorporado dentro do movimento de protesto. Elas protegem os interesses dos mestres do fantoche. Elas asseguram que o movimento de protesto das bases não considerará a questão mais vasta da interferência estrangeira nos assuntos internos de estados soberanos.
Os Facebook, Twitter e bloguistas apoiados e financiados por Washington
Em relação ao movimento de protesto no Egipto, vários grupos da sociedade civil financiados por fundações com sede nos EUA têm dirigido o protesto com o Twitter e o Facebook:
"Activistas do movimento Kifaya (Basta) do Egipto – uma coligação de oponentes ao governo – e o Movimento da Juventude 6 de Abril organizaram os protestos nas redes sociais dos sítios web do Facebook e Twitter". (Ver Voice of America, Egypt Rocked by Deadly Anti-Government Protests
O movimento Kifaya, o qual organizou uma das primeiras acções dirigidas contra o regime Mubarak em 2004, é apoiado pelo International Center for Non-Violent Conflict com sede nos EUA, o qual é ligado à Freedom House. Por sua vez, a Freedom House tem estado envolvida na promoção e treino do Facebook e de blogs Twitter no Médio Oriente e África do Norte.
Os assistidos pela Freedom House adquiriram qualificações em mobilização cívica, liderança e planeamento estratégico, e beneficiam de oportunidades em rede através da interacção com doadores, organizações internacionais e os media baseados em Washington. Depois de retornarem ao Egipto, os assistidos receberam pequenas subvenções para implementar iniciativas inovadoras tais como advogar pela reforma política através do Facebook e de mensagens SMS.
http://www.freedomhouse.org/template.cfm?page=66&program=84 (emphasis added)
De 27 de fevereiro a 13 de março [2010], a Freedom House hospedou 11 bloguistas do Médio Oriente e África do Norte [de diferentes organizações da sociedade civil] para um Advanced New Media Study Tour de duas semanas em Washington, DC. O Study Tour deu aos bloguistas treino em segurança digital, feitura de vídeos digitais, desenvolvimento de mensagens e mapeamento digital.
Enquanto em DC, os assistidos também participaram numa reunião no Senado e encontraram-se com responsáveis de alto nível na USAID, no Departamento de Estado e no Congresso bem como com os media internacional incluindo a Al-Jazeera e o Washington Post . http://www.freedomhouse.org/template.cfm?page=115&program=84&item=87 ênfase acrescentada
Pode-se facilmente perceber a importância concedida pela administração dos EUA a este programa de treino de bloguistas, o qual é complementado com reuniões no Senado, no Congresso, no Departamento de Estado, etc.
O papel do movimento Facebook Twitter como expressão de dissidência deve ser cuidadosamente avaliado à luz de ligações de várias organizações da sociedade civil à Freedom House (FH), à National Endowment for Democracy (NED) e ao Departamento de Estado dos EUA.
A Fraternidade Muçulmana
A Fraternidade Muçulmana constitui no Egito o maior segmento da oposição ao presidente Mubarak. Segundo informações, a Fraternidade Muçulmana domina o movimento de protesto.
Apesar de haver uma proibição constitucional de partidos políticos religiosos, membros eleitos ao parlamento egípcio como "independentes" constituem o maior bloco parlamentar.
A Fraternidade, contudo, não constitui uma ameaça directa aos interesses econômicos e estratégicos de Washington na região. Agências de inteligência ocidentais têm uma longa história de colaboração com a Fraternidade. O apoio britânico à Fraternidade instrumentado através do Serviço Secreto Britânico remonta à década de 1940.
A partir da década de 1950, segundo o antigo responsável de inteligência William Baer, "A CIA [canalizou] apoio à Fraternidade Muçulmana devido à louvável capacidade da Fraternidade para derrubar Nasser". 1954-1970: CIA and the Muslim Brotherhood Ally to Oppose Egyptian President Nasser . Estas ligações encobertas à CIA foram mantidas na era pós Nasser.
Notas conclusivas
A remoção de Hosni Mubarak tem estado, desde há vários anos, nos planos da política externa dos EUA.
A substituição de regime serve para assegurar continuidade, ao mesmo tempo que proporciona a ilusão de que se verificou uma mudança política significativa.
A agenda de Washington para o Egipto tem sido "sequestrar o movimento de protesto" e substituir o presidente Hosni Mubarak por um novo fantoche complacente na chefia do estado.
O objectivo de Washington é sustentar os interesses de potências estrangeiras, defender a agenda económica neoliberal que serviu para empobrecer a população egípcia.
Do ponto de vista de Washington, a substituição de regime não exige mais a instalação de um regime militar autoritário como no auge do imperialismo estadounidense. Ela pode ser implementado pela cooptação de partidos políticos, incluindo a esquerda, financiamento de grupos da sociedade civil, infiltração no movimento de protesto e manipulação de eleições nacionais.
Em relação ao movimento de protesto no Egito, o presidente Obama declarou num vídeo de 28 de janeiro difundido no Youtube: "O governo não deveria recorrer à violência".
A questão mais fundamental é o que é a fonte daquela violência?
O Egito é o maior receptor de ajuda militar dos EUA. Os militares egípcios são considerados serem a base de poder do regime Mubarak.
As políticas estadounidenses impostas ao Egito e ao mundo árabe durante mais de 20 anos, a par de reformas "mercado livre" e da militarização do Médio Oriente, são a causa raiz da violência de Estado.
A intenção da América é utilizar o movimento de protesto para instalar um novo regime.
O movimento popular deveria redirecionar suas energias: Identificar o relacionamento entre a América e "o ditador". Destronar o fantoche político da América mas não esquecer o alvo do "ditadores reais".
Desviar o processo de mudança de regime.
Desmantelar as reformas neoliberais.
Encerrar bases militares dos EUA no Egipto e no mundo árabe.
Estabelecer um governo realmente soberano.

 

Viomundo – O que você não vê na mídia
29 de janeiro de 2011 às 21:28

Saudade do Celso Amorim

por Luiz Carlos Azenha

Eu estou absolutamente convencido de que Dilma Rousseff fará um governo competente e que Antonio Patriota, o ministro das Relações Exteriores que ela escolheu, nos surpreenderá com ideias brilhantes.

Permitam-me, no entanto, declarar que sinto saudade de Celso Amorim.

Sinto saudade de Celso Amorim porque o ex-chanceler brasileiro era capaz de pensar fora do quadrado (out of the box), ou seja, pensar fora da rigidez ideológica que geralmente acompanha os funcionários partidarizados de um governo. Só quem pensa fora do quadrado é capaz de encontrar soluções verdadeiramente inovadoras para velhos problemas. Neste sentido, Celso Amorim era o chanceler perfeito para liderar uma burocracia estatal competente, conhecida pela consistência, como é o Itamaraty.

Assistimos, nas últimas horas, ao desabar do grande pilar da política externa dos Estados Unidos no Oriente Médio: regimes repressivos pró-ocidentais articulados com a prioridade absoluta de Washington nos últimos 50 anos (?), o de garantir a segurança de Israel. Permaneça ou não no poder, no curto prazo Hosni Mubarak será obrigado a fazer concessões impensáveis para um cliente fiel da política externa dos Estados Unidos. Concessões que vão fraturar a ideia de que é possível calar a “rua árabe” às custas de alguns bilhões de dólares em ajuda anual. Estes acontecimentos são de uma enormidade equivalente à queda do muro de Berlim…

Washington já não manda mais no Oriente Médio como sempre mandou. O desgaste de Mubarak não tem relação apenas com o fracasso econômico de seu regime, mas também com o fato de que ele se distanciou da solidariedade árabe ao sofrimento dos palestinos nos territórios ocupados por Israel. Mubarak se vendeu por alguns tostões e, em certa medida, é isso o que os egípcios estão dizendo nas ruas.

A competência de Celso Amorim repousava na capacidade de reconhecer com rapidez as mudanças no cenário internacional e se adaptar a elas. Amorim reconheceu, por exemplo, muito antes que seus pares, o papel central da Turquia como elo de ligação entre os interesses do Ocidente — a Turquia integra a OTAN — e os do Oriente Médio. Amorim reconheceu o papel central que o Irã jogará no futuro da Ásia central, que independe da opinião de Washington a respeito do regime iraniano.

Um tempo de mudanças extraordinárias, como o que estamos experimentando, pede ousadia.

Seria realmente trágico se Dilma Rousseff recuasse na política externa criativa e ousada de Celso Amorim, aceitando pura e simplesmente uma papel subordinado do Itamaraty à política externa seletiva de “Direitos Humanos” de Washington.

Aliás, para quem condenou claramente o Irã, em entrevista ao Washington Post, será que Dilma não está nos devendo uma declaração sobre o Egito?

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